Foto: Zé Carlos de Souza |
Os adultos jamais deveriam prometer algo à toa a uma criança, porque todo pirralho, mesmo aqueles que se mostram mergulhados em silêncio, são capazes de contar os dias ou até mesmo cada minuto que os separam do que lhe foi prometido.
Nos idos da infância, principalmente nos meses de janeiro e fevereiro, a casa dos meus avós, em Areia Branca, vivia abarrotada desses seres de memórias infalíveis, isto é, por mim e meus primos.
Um local da casa passava a impressão que a meninada se assemelhava à abelhas em volta de açúcar: a extremidade do velho terraço, onde tia Chica apurava a inconfundível e doce mistura que, após descansar nas escadinhas de madeira sobre a mesa, fragmentava-se em quadradinhos sobre papeis e que indo aos tabuleiros, dávamos o nome de "cocadas".
Ora, fazíamos qualquer coisa pela oportunidade de rasparmos os resquícios do que sobrava do doce impregnado na panela: íamos ao mercado, fazíamos cafuné na dona das cocadas... virávamos até anjinhos!
No entanto, era muito menino para uma só panela, de maneira que existia uma espécie de rodízio fielmente seguido, ou seja, não se permitia "furar a vez".
Assim, naquela manhã, acordei feliz da vida, porque após longos dias de espera havia chegado o meu momento sublime. Enfim, a grande panela seria só minha, como quase ocorreu.
Ah!... Eu sentado na beirada do piso do alpendre, parecia denotar no rosto toda a felicidade do mundo à medida em que ia me lambuzando com os fiapos de coco queimado envoltos em calda de açúcar já cristalizada.
Foi aí que eu me lembrei que faltava algo, o acessório que sempre fazia parte do acordo: a gigantesca colher de pau. Soltando a citada panela fui tentar resgatar o que supostamente seria meu.
Peguei-me a digladiar com quem, justamente em minha vez, havia quebrado o sagrado pacto. Nem consegui ver a cara do maroto, uma vez que me foi aplicada tamanha colherada na testa. Quem presenciou a tal briga afirmava que em meu rosto parecia morar uma enorme bola de sinuca.
Só sei que acordei no dia seguinte procurando em vão o cobiçado utensílio. Aliás, na sábia tentativa de evitar outras brigas, vovó baniu para sempre o tal rodízio, de forma que, a partir de então, a tal panela só foi, como agora, encontrada em minhas lembranças.
O Autor |
Esse menino na foto é Monte Júnior (em memória)?
ResponderExcluirAcho que é parente dele.
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