sábado, 23 de abril de 2016

CRÔNICA POR ROGÉRIO EDMUNDO SOUZA

Aurora de um despertar


Um certo dia, vi-me dentro de algo que, mais à frente, vim a saber ser uma rede de dormir. A rede balançava e eu, nela deitado, via as telhas que cobriam o quarto, passando para lá e para cá. Eu estava sendo balançado por um ser que depois vim a deslumbrar ser minha mãe, que cantava uma canção de ninar. Eu era um bebê e, naquele momento, estava acordando para o mundo, para a vida. Minha mãe me dava de mamar, depois mamadeiras, me colocava nos braços, na rede, e cantava muitas canções que me acalmavam e me faziam dormir.
Fui crescendo e observando tudo. Minha mãe era muito carinhosa e cuidadosa comigo. Quando eu tinha uns quatro anos, para me agradar, ela, usando uma gaiola com alçapão, pegava todos os “golinhas” que desciam no quintal de nossa casa. Eu ficava encantado com tantos passarinhos. Meu pai, porém, não gostava de vê-los presos e os soltava. Mas nos dias seguintes, minha mãe fazia tudo de novo para me agradar. No entanto, novamente, meu pai os soltava. Mas, para mim, eu não me importava. Eu me sentia feliz. Mamãe, também, em época de inverno, plantava muito milho em nosso quintal. Eu ficava extasiado quando chegava a época da colheita.
Quando atingi, acho que cinco aninhos de idade, eu fugia muito de casa em busca do rio que chamávamos “maré”. Por causa disso minha mãe, certo dia, me prendeu com uma corda no pé da mesa da sala de estar. Descobri que, levantando a mesa, o laço da corda descia e eu me via livre para fugir. Então era só pular a janela e correr para a “maré”. Aí começaram outras atitudes coibitivas contra as fugas. Portas e janelas fechadas, palmadas, etc.
Certo dia ouvi falar, lá em casa, que a “cegonha” iria trazer um irmãozinho para mim. Fiquei muito alegre e feliz. Depois disso a cegonha fez, nos anos que se seguiram, várias viagens à minha casa, sempre trazendo um irmãozinho ou irmãzinha. Mesmo assim minha mãe continuava me dando atenção, amor e carinho.
Quando eu tinha uns 8 anos, já quando toda nossa família passou a residir na casa dos meus avós paternos, que era vizinha à nossa, mamãe deu-me uma bicicletinha de presente, daquelas que tem catraca reversível. Assim que aprendi montá-la, num mês de outubro, cismei de ir à festa do Arraial, a cerca de 10km lá de casa. Na saída da cidade me choquei com outra bicicleta maior e me feri. Alguém me levou para casa. Tomei uma boa “tunda” e a partir daí a bicicletinha, por determinação da minha mãe, ficou presa até ser vendida. Ela só me deu outra quando eu tinha 10 anos. Desta feita uma bicicleta grande, Monark, um verdadeiro sonho de felicidade. Eu, nessas alturas, já me encontrava desperto, razoavelmente, para o mundo e para as coisas da vida. Nasci com vocação para a música. Gostava muito de cantar, tanto no banheiro como nos shows escolares. Assim sendo, resolvi aprender a tocar violão. Foi uma batalha tremenda convencer meu pai a me presentear com um violão, principalmente pelo fato de minha avó dizer sempre: “Walkirio, não compre violão para esse menino, pois ele pode se tornar um boêmio, e aí não vai querer saber de estudo”. Embora essa oposição, meu pai resolveu, com muita alegria, conforme notei, me dar o instrumento. Fiquei muito feliz. Rapidamente aprendi a tocá-lo e a zelá-lo com muito amor. Enchi minha casa de alegria com meu canto e meu violão, acompanhando, inclusive, muitas vezes, minha mãe, que gostava de cantar. Tempos depois atuei em alguns conjuntos musicais como contrabaixista, mas aí é outra historia. Felizmente a previsão boêmia de minha avó não se concretizou.


O autor: Advogado Rogério Edmundo


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